domingo, 11 de novembro de 2012

" A dor dos outros "

A dor dos outros




Gabo Morales/Folhapress A empresária Adriana Trussardi em seu escritório em São Paulo

Clínica paulistana se especializa em
ajudar parentes de pessoas doentes a lidar
com o diagnóstico de problemas graves e
evitar a desestruturação da família
Um diagnóstico impactante de doenças como câncer ou mal de Alzheimer geralmente é acompanhado de um pacote de turbulências que desestruturam a família.
Negação (por parte do doente ou dos familiares), culpa ou sobrecarga de um dos parentes podem fazer parte do "combo", junto a outras questões próprias de cada núcleo familiar.
Foi para tratar especificamente parentes que se sentem despreparados para lidar com um diagnóstico difícil que a psicóloga Cláudia Barroso e a psicanalista Sonia Pires criaram o Bem-me-Care - SOS Family.
O serviço da clínica, em São Paulo, é um tipo de pronto-atendimento para os parentes e pode ser feito em um a sete encontros.
"A gente não trabalha os conflitos preexistentes; a ideia é olhar especificamente para esse trauma que 'quebrou' a família", afirma Pires
"Na maioria das vezes, as angústias dos familiares passam na periferia. O efeito existe, mas nem sempre se olha para isso", diz Barroso.
O atendimento tem uma regra: o paciente não pode participar. Sua presença poderia inibir os familiares a falar sobre a culpa ou a raiva que sentem em relação à situação.
                                      < TRATAMENTO>

 
 

Segundo as especialistas, o trabalho ajuda a fortalecer mecanismos para enfrentar a doença e, como resultado, pode até aumentar o sucesso do tratamento do adoecido.
"Se há negação da doença, o paciente deixa de ter o atendimento e a melhora que poderia ter. Quando você trata a família, acaba provocando efeitos no paciente, colabora com a adesão ao tratamento. Há um entendimento maior sobre a doença e o prognóstico", afirma Barroso.
Foi o que aconteceu com a professora aposentada Reginea Diana Nunes, 56.
O marido dela, Luiz Carlos Ferreira, 61, recebeu o diagnóstico de câncer de intestino no fim do ano passado.
"Aparentemente, ele recebeu bem a notícia, mas, quando saiu do consultório, parecia enlouquecido. Estava em total desequilíbrio. Perguntava 'Por que comigo?', e chorava muito", conta.
"Ele não queria aceitar a doença e colocou na minha mão toda a responsabilidade por sua vida. Eu tinha que falar para ele beber água, comer, ele agia como se fosse uma criança, não seguia as recomendações médicas."
Ela sugeriu que o marido fizesse terapia, mas ele não quis. Abalada, ela própria foi atrás de ajuda profissional. Reginea ficou mais tranquila e auxiliou o marido a enfrentar a doença. "Vi o que era bom para mim e para ele. Mostrei o que ele não via, que poderia acontecer com qualquer um e que ele tinha um caminho a percorrer no tratamento, estava amparado."
Ela dizia também que ele tinha de resolver a insegurança e o medo que sentia da doença voltar e de não poder voltar a trabalhar. Deu tão certo que Luiz Carlos procurou um psicólogo depois.

LIMITES

A empresária Adriana Trussardi, 41, também procurou ajuda quando sua mãe, Katia Abdenour, foi diagnosticada com câncer de ovário em estágio avançado.
"Era difícil acreditar na doença. Queria fazer o possível e o impossível para ela ficar viva", conta.
Quando os médicos falavam em tentar uma nova quimioterapia, sua mãe se recusava. "Ela dizia que queria descansar e eu falava que ela não podia nos abandonar. Sabia que era egoísmo, mas queria lutar até o último minuto", conta Adriana.
A terapia a ajudou a entender e respeitar o sofrimento da mãe. "Minha mãe não falava, não comia e eu a queria viva. Comecei a respeitar a vontade dela."
Ela conta que seu sofrimento se refletiu em seus filhos. "Praticamente passei a morar no hospital e vi que não estava dando muita atenção a eles. A terapia trouxe a estrutura familiar de volta."

DIFERENÇAS

Cada família, com suas relações afetivas, lida com o diagnóstico de uma forma diferente. A recomendação é procurar ajuda quando a pessoa sentir que não consegue suportar a situação.
"As famílias podem ficar presas ao trauma. Às vezes, a pessoa já morreu, mas os parentes ficam voltando àquela época, podem acusar uns aos outros, há quem diga: 'Eu fiquei responsável pelo papai e vocês não fizeram nada'", diz Pires.
Sessões de psicoterapia ou psicanálise, mesmo que fora de centros especializados no tema, ajudam a família a lidar com a questão. Outra opção são os centros de psicologia de hospitais e os grupos de apoio de pacientes. A diferença é que, no último caso, o tratamento costuma ser em grupo.
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Reportagem por MARIANA VERSOLATO DE SÃO PAULO

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