sábado, 30 de janeiro de 2016

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Explicações esfarrapadas - CELSO MING

ESTADÃO - 29/01

A ata foi divulgada nesta quinta-feira sem que nela fosse apontada nenhuma razão técnica para a intempestiva mudança de posição do Banco Central

O Banco Central não convenceu. Por que mudou de rumo? Porque sim. Quem não entendeu que fique sem entender.

Para quem está chegando agora ao assunto, convém recapitular os fatos. Por meio de todos os documentos oficiais e por entrevistas, os diretores do Banco Central haviam preparado o mercado para novo ciclo de alta dos juros, com base na aceleração da inflação. No entanto, em atitude inédita, e só na véspera da reunião do Copom realizada dia 20, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, divulgou nota oficial em que indicava súbita virada no jogo, com base em novas projeções do PIB global anunciadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). É um critério esquisito, na medida em que nunca se viram projeções do FMI serem tomadas como parâmetro de definição de política de juros de nenhum banco central.

Em vez de voltar a puxar os juros para cima, como indicavam os avisos, a decisão do Copom foi mantê-los onde estavam, nos 14,25% ao ano. Prevaleceu entre os analistas a suspeita de que, para não mais puxar pelos juros, o Banco Central obedeceu não a critérios técnicos – e haveria um punhado deles–, mas a ordens superiores, com o que a autonomia da autoridade monetária teria ido para a cucuia, como se diz em Piracicaba.

Mas haveria a Ata do Copom, o instrumento por meio do qual o Banco Central poderia dar suas explicações. A ata foi divulgada nesta quinta-feira sem que nela fosse apontada nenhuma razão técnica para a intempestiva mudança de posição do Banco Central.

O parágrafo 28 fala em incertezas. Entre elas estão os notórios problemas fiscais do Brasil, cuja gravidade, diga-se, não vinha sendo apontada pelo Banco Central até então. Outros focos de incerteza que teriam levado o Banco Central a fazer o que fez foram a demora no realinhamento dos preços que o governo atrasou propositalmente em 2014; e a piora do cenário externo, especialmente as rateadas do motor econômico da China e o afundamento dos preços do petróleo.

São fatos inegáveis. O Banco Central só não conseguiu explicar como esses fatores de repente passaram a trabalhar para derrubar a inflação a ponto de dispensar a nova alta de juros que vinha sendo insistentemente cantada. A desordem fiscal, por exemplo, faz o contrário, concorre para aumentar a inflação; a crise global começou em 2008 e, ainda que possa se agravar e produzir deflação, até agora não contribuiu para derrubar a inflação interna; e o tombo dos preços do petróleo, que começou em 2014, também vem ajudando pouco aqui dentro, porque os preços internos dos combustíveis continuam os mesmos, desta vez para funcionar como muleta para a Petrobrás.

Outra vez: há razões técnicas para justificar até mesmo uma queda – e não apenas a manutenção dos juros internos nos mesmos níveis. O Banco Central poderia, por exemplo, argumentar que a recessão e a queda de renda estão suficientemente intensas para derrubar o consumo, fator que, por sua vez, acabaria puxando os preços para baixo sem o concurso de maior aperto monetário. No entanto, a ata não vai por esse caminho nem explica por que, de um dia para o outro, o que era para valer deixou de valer.

CONFIRA:


evolução rendimento real

Veja acima a evolução do rendimento real da população ocupada.


Tombo na renda
O nível de desemprego de dezembro ficou menor do que o de novembro: 6,9% ante 7,5%. Mas isso não deve ser tomado como indicação de melhora do mercado de trabalho, porque dezembro é mês atípico: há redução de procura de trabalho por aumento da ocupação (vendas de final de ano). A informação mais relevante é a da queda real da renda em relação a dezembro de 2014 (-5,8%), o que deve levar à redução do consumo e, a partir daí, à queda da atividade econômica.

" MImos incômodos "

EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 30/01




Num dia, a OAS. Em outro, a Odebrecht. Mais uma vez, surgem sinais comprometedores de que as relações entre grandes empreiteiras nacionais e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) extravasaram dos limites impostos pela ética republicana.

Primeiro, o apartamento no Guarujá. Agora, o sítio em Atibaia. Nos dois casos, um padrão se repete. Uma grande construtora, responsável por incontáveis obras contratadas pelo governo federal, realiza melhorias num imóvel que beneficiaria o ex-presidente.

No caso do tríplex na praia das Astúrias, um engenheiro calculou em R$ 777 mil o montante gasto pela OAS, no ano de 2014, em obras no apartamento, do qual a família de Lula tinha uma opção de compra –a qual só foi abandonada em 2015, diante da reação pública negativa ao negócio.

Reportagem publicada nesta sexta-feira (29) pela Folha traz relatos segundos os quais, ao final do segundo mandato do petista, a Odebrecht responsabilizou-se por despesas num sítio utilizado por ele e seus familiares.

A propriedade, dividida em duas partes, está registrada em nome de dois sócios de Fábio Luís da Silva, filho do ex-presidente. A circunstância não atenua o incômodo em torno do caso; antes o agrava, quando se toma conhecimento dos cuidados que, conta-se, cercavam os contatos entre a Odebrecht e fornecedores locais.

Conforme declarações da proprietária de um depósito de materiais de construção à época das obras de benfeitoria, as notas fiscais do que era adquirido foram diluídas, a pedidos, em nome de outras empresas.

Os pagamentos, ela afirma, eram feitos em dinheiro vivo, transportado em proverbiais maletas e envelopes de papel pardo.

Engenheiro da Odebrecht, Frederico Barbosa admite ter dado "algum apoio" à reforma, enquanto estava em férias. Estranhamente, um dos principais nomes da empreiteira na construção da Arena Corinthians declara ter prestado esse "bico" a uma empresa cujo nome desconhece.

"Era uma empresa, cujo dono se chamava Carlos, eu não lembro do nome dele. Era uma empresa pequena, eu não me recordo qual era a razão social dela", diz.


Dadas as dimensões milionárias dos escândalos em curso nas operações Lava Jato e Zelotes, é até possível que, na cultura que predomina no relacionamento entre empreiteiras e os mais altos nomes do Executivo, benesses como essas sejam vistas mesmo como meros mimos, agrados, iniciativas de relações públicas.



Talvez essa seja a defesa mais plausível ao alcance de Lula.

" A Lambuzada de Lula "

 IGOR GIELOW

    FOLHA DE SP -30/01


BRASÍLIA -

 Coube a um lulista, Jaques Wagner, cunhar uma colorida e condescendente definição para a corrupção na era PT: não acostumada às benesses do poder, a "companheirada" havia se lambuzado.



O exemplo pode ter vindo do chefe. Após ter radares das mais graúdas investigações do país sobre si, Lula acaba a semana colecionando indícios de que se lambuzou no varejo.



A cereja foi revelada na sexta (29): a Odebrecht, empreiteira cujos milhões pagos a Lula após a Presidência são apurados, reformou segundo testemunhas ouvidas pela Folha um sítio usado por ele ainda no cargo.



Isso se soma ao imbróglio do já notório tríplex do Guarujá, investigado por ser suposto objeto de propina e lavagem de dinheiro, sobre o qual o casal Lula terá de depor.



Soa até venial perto da gravidade de outras suspeitas que batem no nome de Lula e no de sua família nas operações Lava Jato e Zelotes. Mas não é. Honestidade é um valor absoluto, apesar de o petista acreditar em gradações. Se comprovadas, as lambuzadas serão indeléveis, além de serem de fácil compreensão popular.


Com isso, o mito se esvai. Adaptando Sófocles, só o tempo revela o homem justo, mas bastam algumas reportagens para desnudar o pérfido. Lula tem obviamente o benefício da dúvida, mas, se não for inocente, corre o risco de ver seu séquito reduzido a variantes do agente Mulder, da rediviva série de TV "Arquivo X" e cujo lema é: "Eu quero acreditar".



Seria a pá de cal no que resta de futuro para o PT, destroçado por escândalos e pela má gestão –estão aí petrolão, mosquito e recessão para provar, assim como os paliativos respectivos ofertados por Dilma.




Pode, no limite, refluir a sigla de nicho, só trocando os universitários/sindicalistas/"intelectuais" de outrora por "hipsters" e suas agendas autoindulgentes. Na prática, além de tosca institucionalmente, a ação tucana pedindo a extinção do PT é inócua por sugerir algo já em curso.

" A RODA QUE GIRA "

Foto: Gonda / Arte ZH - J.J.CAMARGOJ.J. Camargo: a roda que gira Gonda/Arte ZH
É difícil entender o que leva alguns a considerar que nossa vida deva ser sempre um modelo interessante e original, quando, na verdade, vivemos sob o tacão do passado com raras oportunidades de sermos de fato criativos. E, para quem valoriza sossego, é melhor que seja assim, pois qualquer sinalização de novidade já provoca uma compreensível reação, às vezes francamente destemperada, dos que seguem a cartilha relaxante da mediocridade e não toleram comparações pretensamente humilhantes.
Então, se assumimos que somos meros copiadores dos modelos disponíveis, sem arroubos de genialidade desgastante, é importante que atentemos para os exemplos que passamos aos nossos filhos que, por afeto, proximidade e descendência, são os nossos plagiadores naturais e instintivos.
Pode ser que o modelo de afeto que dispensas aos teus pais não seja suficiente para sensibilizar teus filhos nos cuidados desvelados dos avós, mas não tenha dúvida de que esse modelo será ressuscitado no futuro quando tocar a eles decidirem que apreço merecerás na velhice. E não há nada de espetacular neste comportamento. É só a roda da vida que também não se preocupa em ser original.
Fiquei com pena quando visitei a dona Carolina, com 82 anos, boa saúde, alojada num cubículo improvisado numa extensão da garagem, com um ventilador pequeno e insuficiente no canto da parede, uma TV de tubo com imagem e chuvisco, e uma amostra escassa de céu espremida entre muro alto e um varal de roupas ao vento. Na estante, uma Bíblia de capa de couro marrom, Contos Fluminenses, de Machado de Assis, um livro de palavras cruzadas sem capa e uma cestinha com incontáveis prendedores de cabelo. De plástico barato. A nora que pedira a consulta, advertira que a dita alegava uma dor no tórax, mas que não levava muita fé nessa queixa porque ela tinha um raio-x de tórax do ano anterior que fora normal e, além disso, já não andava mais dizendo coisa com coisa. "De qualquer maneira, é melhor ter certeza que não tenha nada grave, ainda que estejamos preparados. Porque, nesta idade... o que esperar? É a roda da vida e ninguém vive para sempre, não é, doutor?". Pois é.
O exame físico era normal e ela nem lembrava de queixa nenhuma, mas queria mesmo era conversar, e como conversamos. Com uma memória prodigiosa e um senso de humor apurado, foi uma das entrevistas para não esquecer. Com espírito leve e debochado, não guardava nenhuma mágoa e só lamentava que todas as suas amigas preferidas já tivessem morrido e da pouca paciência que tinha de conquistar novas entre essas velhas estranhas que gostavam de Big Brother. Se pudesse fazer um pedido, seria o de trocar a TV velha sem imagem por um rádio. Se era para curtir só o som, que fosse sem o maldito chiado. Mas se prometera que esta seria uma negociação para o próximo Natal. Se houvesse.
Quando saí, a nora mais velha quis saber o que achara da velha insuportável e ficou visivelmente chateada quando confessei que me apaixonara pela vózinha doce e bem-humorada.
E descarregou a irritação no filhote de uns 12 anos que brincava na terra, no jardim: "Carlos Eduardo, já para dentro! Não espere eu te pegar pelas orelhas, entendido?".
"Não enche, tá?" foi a resposta. Bati o portão convencido de que aquela roda estava começando a girar. À distância, até fiquei com a impressão que ouvira um rangido.

" O Sistema prisional,a INSEGURANÇA e a burrice estatal "

Carlos Eduardo Richinitti

Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado

Por: Carlos Eduardo Richinitti

Quem tem contato com a realidade prisional do Rio Grande do Sul — onde o Presídio Central, o pior do Brasil, se destaca — experimenta dois sentimentos: em primeiro lugar, a vergonha de ser gaúcho. Em segundo, a revolta com a burrice e incompetência do Estado, pois o descaso de anos está se refletindo, agora, nas ruas.
Instalou-se um verdadeiro sentimento de faroeste, em uma terra sem lei. Os bandidos, em deboche à autoridade do xerife, já sem hora ou local, fazem acontecer. Viver ou morrer — por bala perdida ou achada pela bandidagem dominante — é mera questão de sorte ou azar.
Uma série de causas contribui para o atual quadro de violência: tráfico, educação deficiente, crise financeira, desigualdade social, impunidade e falta de policiamento são, sem dúvida, elementos inafastáveis. No entanto, é justamente no caos prisional que está um dos principais fatores responsáveis pela situação caótica atual e, pior, talvez a com solução mais fácil, com repercussão mais efetiva, rápida e menos onerosa.
O Estado está literalmente ajudando a organizar o crime, pois, incapaz de melhorar as prisões, entregou sua administração aos bandidos, que se organizam em facções. Quanto pior for a situação por lá — quanto mais degradante se revelar aquele ambiente —, maior será o poder das facções. Estas mantêm a ordem lá dentro, mas cobram pela comida e pela proteção dispensada, substituindo o Estado, arregimentando e comprometendo presos, que pagam, quando saem às ruas, o que devem cometendo outros ilícitos.
Experiências no mundo todo mostram que o combate ao crime é, antes de tudo, um serviço de inteligência. Não há dúvidas de que precisamos de mais policiais e que a lei precisa ser mais dura e efetiva. No entanto, é urgente que atentemos ao quadro de indignidade vigente nas nossas masmorras medievais, pois o caos dessa realidade está regurgitando violência e servindo literalmente para organizar o crime aqui fora.
Urge, por uma questão de direitos humanos e até mesmo de racionalidade, que retomemos o controle das prisões, dando um mínimo de dignidade para quem está no sistema, evitando que lideranças substituam o Estado. Soa óbvio, mas talvez seja muito à política que age e pensa apenas pela visão curta daquilo que dá voto — ainda que essa omissão esteja literalmente matando culpados e inocentes (ditos livres) nas ruas.

" Mosquito tem Cérebro ? "

Artigo   Zero Hora

Rodrigo Lorenzoni    < presidente do conselho regional de medicina Veterinária - RS


A pergunta soa infantil, mas na verdade é uma provocação. Mosquito tem cérebro, sim, bem pequenininho, e parece que usa mais do que os seres humanos. Afinal, um ser minúsculo vem vencendo batalhas diárias contra nós. Vemos as doenças se espalharem, atingindo mais e mais pessoas, provocando impactos sérios na saúde pública e gastos milionários na prevenção e controle.
Os mosquitos são vetores de doenças que matam milhões de pessoas todos os anos no mundo. Não falo aqui apenas de dengue, chincungunya ou zika, transmitidas pelo Aedes aegypti.
São dezenas de doenças que têm em diferentes mosquitos seus vetores. A febre amarela e a malária são outros problemas sérios no planeta. No Brasil, a malária está concentrada na Região Norte e é doença de alta letalidade. Fico refletindo se, assim como a dengue não era registrada em muitos Estados há alguns anos, existe risco de esta outra grave enfermidade cruzar divisas. O que fizemos para evitar que o Aedes aegypti tomasse conta do país? Nada. Por isso é importante refletirmos sobre a possibilidade de outros vetores chegarem por aqui.
Apesar de todos os apelos, ensinamentos e dicas apresentados incansavelmente pelos governos e instituições ligadas à saúde pública, as larvas do mosquito Aedes aegypti são encontradas facilmente em qualquer ambiente. É preciso que a comunidade encare este problema como algo de responsabilidade própria.
E sobre a provocação do título: a fêmea do mosquito da dengue protege sua prole. Faz uma análise minuciosa do local onde vai colocar os ovos. Verifica se a água está limpa, se pode evaporar ou aquecer demais. Se houver qualquer risco, ela levanta voo e procura outro lugar em melhores condições. Ela se certifica de que os ovos terão condições para eclodir. Fazemos isso em relação a nossa família? Tomamos todos os cuidados?
Um mosquito, em geral, vive entre 30 e 35 dias e não se desloca por mais de cem metros. Então, a ocorrência de doença bem pertinho da nossa casa pode ser responsabilidade nossa.


" Estímulo Ao Crédito "

Foto: Gilmar Fraga / Arte ZHEstímulo ao crédito Gilmar Fraga/Arte ZH

Ainda que tenha sido recebido com desconfiança por economistas e operadores do mercado, o pacote de medidas de estímulo ao crédito anunciado pelo governo durante reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social é bem-vindo. As dúvidas sobre o resultado efetivo da medida não são suficientes para abalar o mérito da decisão. É claro que, como observam setores do empresariado, a retomada do crescimento ou pelo menos o estancamento da queda do PIB dependem de outros gestos mais decididos, além do que pretende reestimular o consumo. O que o governo mais precisa é recuperar a confiança de quem produz, o que depende também do Congresso.
O que importa é que dirigentes empresariais viram na última reunião do Conselho alguns sinais de que o Executivo não ficará paralisado diante da ameaça concreta da repetição, em 2016, da queda de mais de 3% do PIB no ano passado. O Brasil entraria então no terceiro ano, não só de estagnação, mas de retrocesso econômico, com graves consequências para emprego, renda e receitas do próprio setor público. A alternativa do crédito, levada em conta pelo governo a partir de sugestões do próprio empresariado, é uma resposta às demandas de representantes da sociedade presentes no Conselho.
Não se espera que o governo pretenda contar com oferta de crédito para resolver, de imediato, os graves problemas nacionais. Há consenso entre observadores da situação brasileira, inclusive no Exterior, de que o Brasil só poderá pensar em recuperação a partir de 2017. Por isso, será preciso, tão logo o Congresso retome suas atividades, continuar insistindo na defesa das medidas do ajuste fiscal, ainda não votadas, e enfrentar questões estruturais, como as reformas previdenciária e tributária. Sem isso, o que teremos mais adiante, ao invés do resgate da confiança, será a fragilização ainda maior do governo e, em consequência, também da economia.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

" Geração Y : jovens, talentosos e limitados "


O caminho para a vida adulta tem sido cada vez mais longo e difícil (Foto: Pixabay)

A geração Y, ou geração do milênio, é jovem e talentosa, mas é preciso que reivindique seu lugar na sociedade

Cerca de um quarto da população mundial, ou aproximadamente 1,8 bilhão, já tem 15 anos, mas ainda não completou 30 anos. Em muitos aspectos, são jovens que vivem nas condições mais favoráveis jamais existentes. São mais ricos e mais bem-educados do que qualquer geração anterior. Então, por que não estão contentes?

Existem diversos motivos para que esses jovens se sintam insatisfeitos. Pela primeira vez nahistória os jovens têm um conjunto de padrões de comportamento, crenças, conhecimentos, costumes etc. em comum e, portanto, compartilham as mesmas queixas. No mundo inteiro, os jovens reclamam que é muito difícil encontrar um emprego e um lugar para morar, e que o caminho para a vida adulta tem sido cada vez mais longo e difícil.

Muitos de seus problemas podem ser atribuídos às políticas que privilegiam as gerações mais velhas como, por exemplo, o trabalho formal. Em muitos países, as leis trabalhistas exigem que as empresas ofereçam inúmeros benefícios aos funcionários e dificultam a demissão deles. Essas leis não só protegem os funcionários que, em geral, são mais velhos, como também restringem a oferta de novos empregos.

A questão da moradia também não favorece os jovens. Os proprietários de imóveis impõem suas exigências quanto à construção de novos prédios e casas. Com frequência dizem não, porque não querem que estraguem a vista de suas casas ou depreciem seus preços. O excesso de regulamentação duplicou o custo de uma casa comum na Grã-Bretanha. Seus efeitos são ainda piores em muitas das grandes cidades onde os jovens querem morar.

Mas esses jovens poderiam ter uma atitude mais firme e participativa se querem ter voz ativa nas sociedades em que vivem. Nos Estados Unidos pouco mais de um quinto de jovens de 18 a 34 anos votou na última eleição geral; por outro lado, três quintos de pessoas com mais de 65 anos votaram. Esse padrão de comportamento se repete na Indonésia e é um pouco melhor no Japão. Não é suficiente que os jovens assinem petições online. Se quiserem fazer reivindicações aos governos, é preciso que votem e exerçam seus direitos e deveres de cidadãos.
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Fonte: http://opiniaoenoticia.com.br/vida/geracao-y-jovens-talentosos-e-limitados/ 29/01/2016

" Do Aedes aegypti " à ts´-tsé "

FERNANDO GABEIRA

ESTADÃO - 29/01

A crise brasileira é um fato internacional. Dentro dos nossos limites, estamos puxando a economia mundial para baixo. Nossa queda não impacta tanto quanto a simples desaceleração chinesa. Mas com alguma coisa contribuímos: menos 1% no crescimento global.


Na crise da indústria do petróleo, com os baixos preços do momento, o Brasil aparece com destaque. Cerca de 30% dos projetos do setor cancelados no mundo foram registrados aqui, com o encolhimento da Petrobrás. Dizem que os brasileiros eram olhados com um ar de condolências nos corredores da reunião de Davos. Somos os perdedores da vez.

Diante desse quadro, Dilma diz-se estarrecida com as previsões negativas do FMI. Quase todo mundo está prevendo uma crise de longa duração e queda no PIB. Centenas de artigos, discursos e relatórios fortalecem essa previsão.

 Dilma, se estivesse informada, ficaria estarrecida por o FMI ter levado tanto tempo para chegar a essa conclusão. Ela promete que o Brasil volta a crescer nos próximos meses. No mesmo tom, Lula declarou aos blogueiros amestrados que não existe alma viva mais honesta do que ele. Não é recomendável entrar nessas discussões estúpidas. Não estou seguro nem se o Lula é realmente uma alma viva.


A troca de Levy por Barbosa está sendo vista como uma luta entre keynesianos e neoliberais. Pelo que aprendi de Keynes, na biografia escrita por Robert Skidelsky, é forçar um pouco a barra acreditar que sua doutrina é aplicável da forma que querem no Brasil de hoje. 

É um Keynes de ocasião, destinado principalmente a produzir algum movimento vital na economia, num ano em que o País realiza eleições municipais. É o voo da galinha, ainda que curtíssimo e desengonçado como o do tuiuiú.

O Brasil precisa de uma década de investimentos vigorosos, para reparar e modernizar sua infra. Hoje, proporcionalmente, gastamos nisso a metade do que os peruanos gastam.

O governo não tem fôlego para realizar essa tarefa. Isso não significa que não haja dinheiro no Brasil ou no mundo. Mas são poucos os que se arriscam a investir aqui.


 Não há credibilidade. O populismo de esquerda não é uma força qualquer, ele penetra no inconsciente de seus atores com a certeza de que estão melhorando a vida dos pobres. 

E garante uma couraça contra as críticas dos que “não querem ver pobre viajando de avião”.

Em 2016 largamos na lanterna do crescimento global. Dilma está estarrecida com isso e a mais honesta alma do Brasil diz “sai um lorde Keynes aí” como se comprasse cigarros num botequim de São Bernardo do Campo.

Aos poucos, o Brasil vai se dando conta da gravidade da epidemia causada peloAedes aegypti. Gente com zika foi encontrada nos EUA depois de viajar para cá.
 

As TVs de lá martelam advertências às grávidas. Na Itália quatro casos de contaminação foram diagnosticados em viajantes que passaram pelo Brasil. O ministro da Saúde oscila entre a depressão e o entusiasmo.

 Ora exagera o potencial das campanhas preventivas, ora reconhece de forma fatalista que o Brasil está perdendo feio a guerra para o mosquito. Com nossa estrutura urbana, é quase impossível acabar com o mosquito. Mas há o que fazer.

Não se viu Dilma estarrecida diante da epidemia. Nem a mais honesta alma do Brasil articulando algo nessa direção. Solução que depende do tempo, a vacina ainda é uma palavra mágica.

No entanto, estamos nas vésperas da Olimpíada. Os líderes que a trouxeram para o Brasil, nos tempos de euforia, quase não tocam no assunto; não se sentam para avaliar como nos degradamos e como isso já é percebido com clareza lá fora.

A Economist publica uma capa com Dilma olhando para baixo e o título: A queda do Brasil. Na economia, área em que as coisas andam mais rápidas, não há mais dúvidas sobre o fracasso.

A segunda maior cidade do Rio, Estado onde se darão os Jogos, simplesmente quebrou. 

Campos entrou em estado de emergência econômica, agora que os royalties do petróleo parecem uma ilusão de carnaval.

O problema dos salvadores do povo é que não percebem outra realidade exceto a de permanência no poder. Quanto pior a situação, mais se sentem necessários. Os irmãos Castro acham que salvaram Cuba e levaram a um patamar superior ao da Costa Rica, por exemplo. O chavismo levou a Venezuela a um colapso econômico, marcado pelas filas para produtos de primeira necessidade, montanhas de bolívares para comprar um punhado de dólares. Ainda assim, seus simpatizantes dizem, mesmo no Brasil, que a Venezuela está muito melhor do que se estivesse em mãos de liberais.



O colapso, a ruína, a decadência, nada disso importa aos populistas de esquerda. Apenas ressaltam suas boas intenções e a maldade dos críticos burgueses, da grande mídia, enfim, de qualquer desses espaços onde acham que o diabo mora. O Lula tornou-se o símbolo desse pensamento. Na semana em que se suspeita de tudo dele, do tríplex à compra de caças, do petrolão às emendas vendidas, chegou à conclusão de que não existe alma viva mais honesta do que ele.

Aqueles que acreditam num diálogo racional com o populismo de esquerda deveriam repensar seu propósito. Negar a discussão racional pode ser um sintoma de intolerância. Existe uma linha clara entre ser tolerante e gostar de perder tempo. O mesmo mecanismo que leva Lula a se proclamar santo é o que move a engrenagem política ideológica do PT. Quando a maré internacional permitiu o voo da galinha, eles se achavam mestres do crescimento. Hoje, com a maré baixa, consideram-se os mártires da intolerância conservadora. Simplesmente não adianta discutir. No script deles, serão sempre os mocinhos, nem que tenham de atacar a própria Operação Lava Jato.

Considerando que Cuba é uma ditadura e a Venezuela chega muito perto disso com sua política repressiva, como explicar a aberração brasileira?

Certamente algum mosquito nos mordeu para suportarmos mentiras que nos fazem parecer otários. Não foi o Aedes aegypti. A tsé-tsé, quem sabe?

" O Pacote de crédito e as eleições "

RAQUEL LANDIN

FOLHA DE SP - 29/01

Ao participar do Fórum de Econômico de Davos na Suíça, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, disse que levaria o "cavalo para beber água". Com essa analogia, tentava explicar a lógica o pacote de R$ 83 bilhões de estímulo ao crédito anunciado nesta quinta-feira (28).



A aposta do governo é que empresas e famílias estão com "sede" de crédito e vão acabar tomando novos empréstimos, ao contrário da expectativa de boa parte dos analistas do setor privado. Para os economistas, a recessão, o desemprego, a inflação e o alto nível de endividamento reduzem a demanda por crédito, reduzindo os efeitos das medidas.

Também utilizando uma analogia, esse pacote tem sabor de comida requentada. A essência é igual ao que foi feito nos últimos anos, só que com menos margem de manobra por causa do estrago nas contas públicas do primeiro mandato de Dilma.

De novo, o governo vai utilizar os bancos e fundos públicos - BNDES, Caixa, Banco do Brasil, FI-FGTS - para emprestar a juros atraentes para alguns setores. A diferença é que o Tesouro não tem recursos para subsidiar diretamente e o dinheiro vai ter que sair totalmente do lucro dessas instituições.

Os setores e modalidades incentivados - consignado, habitacional, construção civil, máquinas e equipamentos, pequenas e médias empresas, exportadores, rural- mostram que até existe uma tentativa de elevar os investimentos, mas a grande preocupação é estimular o consumo.

A prioridade em destravar o crédito mostra que, mais uma vez, o interesse do governo é, principalmente, político e não econômico. Pressionado pelo PT, Barbosa se esforça para estancar a recessão e provocar pelo menos um leve crescimento do PIB, a fim de dar alento aos candidatos petistas nas eleições municipais e, principalmente, na disputa do pleito presidencial em 2018.



É verdade que os bancos estão restritivos na concessão de crédito e essas medidas poderiam dar uma perspectiva positiva para a economia brasileira, desde que acompanhadas do ajuste fiscal e das reformas previdenciária, trabalhista e política, além de forte estímulo às concessões de infraestrutura. Sem as reformas, não haverá mudança de expectativa, retomada do investimento, e retorno ao crescimento.

Se os economistas já duvidam que esse pacote de crédito estimule a economia no curto prazo, não resta dúvida de que - isoladamente - não vão adiantar nada no médio e longo prazo. Pode até agravar o ceticismo do mercado por repetir velhas receitas.

O problema do Planalto é que reformas estruturais podem indispor o PT com o eleitor. Por isso, transformam-se em promessas muitas vezes repetidas e nunca cumpridas.

p.s: Vale lembrar que outros partidos também costumam colocar a política à frente da economia quando estão no poder. O ex-presidente Fernando Henrique (PSDB) segurou a desvalorização do câmbio até o início de 1999 para garantir à reeleição. Também só começou a arrumar de verdade as contas públicas no segundo mandato.

" A Urgência da Hora "

 MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 29/01

O país vive uma crise avassaladora que justifica chamar representantes da sociedade, ouvir sugestões e propor medidas. Mas tudo só faria sentido se as propostas tivessem a dimensão da crise. O governo precisa ter noção de que estamos afundando e que as más notícias diárias podem ter entorpecido os seus sentidos, mas não domestica a crise. Ela está piorando.

O ex-ministro Delfim Netto fez um chamado à ação em declarações nos últimos dias que repercutiram porque é isso que muita gente sente. Numa entrevista para Claudia Safatle, do Valor Econômico, disse que a presidente Dilma precisa governar. Ontem, estive com ele, no seu escritório em São Paulo, e gravei uma entrevista para a Globonews. Em resumo, o que tem dito é que a presidente precisa ir ao Congresso e propor reformas fortes que sempre foram bloqueadas pelo seu partido. É uma emergência. “É para salvar o país”.


Delfim traça o quadro. O país já está com 10 milhões de desempregados. A recessão deve destruir outros 4% do PIB este ano. Ontem, foram divulgadas as contas do governo central: um déficit de R$ 115 bilhões. Há empresas, segundo me contou esta semana o economista José Roberto Mendonça de Barros, que, apesar de sólidas e bem geridas, tiveram uma escalada de endividamento em poucos meses. Não porque tomaram mais crédito, mas porque o faturamento caiu drasticamente e a dívida/ebitda deu um salto. O que vários economistas estão dizendo, independentemente de diferenças de pensamento entre eles, é que a partir de um determinado ponto uma crise escala e o país despenca.

O sinal de alerta de que estamos neste momento criando sequelas irreversíveis é a propagação do zika, esse inimigo do futuro. O vírus, ao destruir cérebros dos não nascidos, construiu a metáfora trágica deste momento de descuido, de descontrole, de desgoverno. Alguns casos nos Estados Unidos fizeram o presidente Barack Obama invocar a segurança nacional. É de segurança nacional que se trata, e não de torcer para que as mulheres contraiam o vírus antes de engravidar.

Havia interesse na reunião do Conselho Econômico e Social de ontem. Dois ex-conselheiros estão na prisão, Marcelo Odebrecht e José Carlos Bumlai, mas isso não desmerece o grupo. Ele tem pessoas relevantes em diversas áreas. Mas tudo foi feito na mesmice de sempre. Alguns elogios, como o da presidente da UNE, que disse que “os estudantes foram os mais privilegiados pelas políticas sociais do país”. Felizmente, a UNE não representa os estudantes brasileiros, porque se tivéssemos, a esta altura, uma juventude conformada seria ainda mais difícil encontrar o futuro. A propósito, o desemprego atinge principalmente os jovens.

A reunião foi fechada, apesar de atrair interesse. O país podia apenas acompanhar as pílulas distribuídas pela conta do Conselho no Twitter. Que segredo o governo queria guardar? Um segredo entregue a 100 pessoas?



Alexandre Tombini, presidente do Banco Central de um país que está com inflação de dois dígitos, disse que “permanecerá” vigilante e tomará as “medidas necessárias” para ter a inflação em 4,5% em 2017. O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, que fez parte das alquimias e invenções que arruinaram os cofres, propôs uma novidade. Duas. Um limite legal para o crescimento do gasto, mas, ao mesmo tempo, uma margem legal para acomodar as flutuações de receita. Propôs uma coisa e o seu contrário. Haverá limite, mas apenas se der para cumprir.

O país precisa de mudanças mais radicais. Tão profundas quanto a crise em que afundamos. De uma, a presidente Dilma falou, mas de forma contraditória: a reforma da Previdência que, pelo que disse, será um omelete que não quebrará ovos. Vai se tornar sustentável, mas não vai ferir direitos adquiridos nem expectativas de direito. Desta forma, ela só entraria em vigor quando os trabalhadores de hoje já estivessem aposentados. Será tarde.
A proposta concreta feita pelo ministro da Fazenda é maior do que o número antecipado nos jornais, mas é, de novo, ofertar mais crédito a um país endividado, inclusive com a sandice de usar o FGTS como garantia. Teria sido uma boa ideia conversar sobre a crise com líderes da sociedade, se o governo não fosse tão sem noção da urgência da hora.

" Explicações esfarrapadas "

CELSO MING

ESTADÃO - 29/01

A ata foi divulgada nesta quinta-feira sem que nela fosse apontada nenhuma razão técnica para a intempestiva mudança de posição do Banco Central

O Banco Central não convenceu. Por que mudou de rumo? Porque sim. Quem não entendeu que fique sem entender.

Para quem está chegando agora ao assunto, convém recapitular os fatos. Por meio de todos os documentos oficiais e por entrevistas, os diretores do Banco Central haviam preparado o mercado para novo ciclo de alta dos juros, com base na aceleração da inflação. No entanto, em atitude inédita, e só na véspera da reunião do Copom realizada dia 20, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, divulgou nota oficial em que indicava súbita virada no jogo, com base em novas projeções do PIB global anunciadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). É um critério esquisito, na medida em que nunca se viram projeções do FMI serem tomadas como parâmetro de definição de política de juros de nenhum banco central.

Em vez de voltar a puxar os juros para cima, como indicavam os avisos, a decisão do Copom foi mantê-los onde estavam, nos 14,25% ao ano. Prevaleceu entre os analistas a suspeita de que, para não mais puxar pelos juros, o Banco Central obedeceu não a critérios técnicos – e haveria um punhado deles–, mas a ordens superiores, com o que a autonomia da autoridade monetária teria ido para a cucuia, como se diz em Piracicaba.

Mas haveria a Ata do Copom, o instrumento por meio do qual o Banco Central poderia dar suas explicações. A ata foi divulgada nesta quinta-feira sem que nela fosse apontada nenhuma razão técnica para a intempestiva mudança de posição do Banco Central.

O parágrafo 28 fala em incertezas. Entre elas estão os notórios problemas fiscais do Brasil, cuja gravidade, diga-se, não vinha sendo apontada pelo Banco Central até então. Outros focos de incerteza que teriam levado o Banco Central a fazer o que fez foram a demora no realinhamento dos preços que o governo atrasou propositalmente em 2014; e a piora do cenário externo, especialmente as rateadas do motor econômico da China e o afundamento dos preços do petróleo.

São fatos inegáveis. O Banco Central só não conseguiu explicar como esses fatores de repente passaram a trabalhar para derrubar a inflação a ponto de dispensar a nova alta de juros que vinha sendo insistentemente cantada. A desordem fiscal, por exemplo, faz o contrário, concorre para aumentar a inflação; a crise global começou em 2008 e, ainda que possa se agravar e produzir deflação, até agora não contribuiu para derrubar a inflação interna; e o tombo dos preços do petróleo, que começou em 2014, também vem ajudando pouco aqui dentro, porque os preços internos dos combustíveis continuam os mesmos, desta vez para funcionar como muleta para a Petrobrás.

Outra vez: há razões técnicas para justificar até mesmo uma queda – e não apenas a manutenção dos juros internos nos mesmos níveis. O Banco Central poderia, por exemplo, argumentar que a recessão e a queda de renda estão suficientemente intensas para derrubar o consumo, fator que, por sua vez, acabaria puxando os preços para baixo sem o concurso de maior aperto monetário. No entanto, a ata não vai por esse caminho nem explica por que, de um dia para o outro, o que era para valer deixou de valer.

CONFIRA:


evolução rendimento real

Veja acima a evolução do rendimento real da população ocupada.


Tombo na renda
O nível de desemprego de dezembro ficou menor do que o de novembro: 6,9% ante 7,5%. Mas isso não deve ser tomado como indicação de melhora do mercado de trabalho, porque dezembro é mês atípico: há redução de procura de trabalho por aumento da ocupação (vendas de final de ano). A informação mais relevante é a da queda real da renda em relação a dezembro de 2014 (-5,8%), o que deve levar à redução do consumo e, a partir daí, à queda da atividade econômica.

" O Pacote de crédito, no varejo "

 VINICIUS TORRES FREIRE

                   FOLHA DE SP - 29/01

A propaganda diz que o governo tomou medidas a fim de aumentar em R$ 83 bilhões o total de empréstimos para empresas e consumidores, uma dinheirama prontinha para ser emprestada a gente prontinha para tomar empréstimos.

                                    Não é bem assim.

Não se sabe se vai haver interessados em conceder e tomar empréstimos; parte do pacote se destina a atenuar as agruras de gente superendividada ou é refinanciamento. Não se sabe até quando esse dinheiro vai sair do papel.

Isto posto, empresários e sindicalistas ficaram contentes. Algo inquietante, o FGTS é a vaca leiteira do pacote: 60% dos fundos potenciais vêm de lá.

Até R$ 17 bilhões podem ser emprestados a quem quiser fazer empréstimo consignado usando o FGTS como garantia (se der calote, seu FGTS cobre). Isso ainda depende de mudança legal. Aprovado, baratearia empréstimos para muita gente enforcada em, por exemplo, cartão de crédito e cheque especial.

Outros R$ 15 bilhões do pacote serão destinados à renegociação de dívidas de empresas que compraram máquinas e equipamentos com crédito do BNDES (do Programa de Sustentação do Investimento, PSI). Trata-se de ajudar quem investiu e, em parte devido à crise, tem dificuldade de pagar as prestações.

O crédito para a compra de imóveis pode aumentar em até R$ 10 bilhões nos bancos caso essas instituições financeiras vendam ao FGTS empréstimos que já concederam. Isto é, o FGTS compraria Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), uma aplicação que rende o valor das prestações dos imóveis.

A instituição financeira que vende esse crédito ao FGTS (vende o direito de receber as prestações imobiliárias, o CRI) fica então com mais capital para emprestar a possíveis novos interessados em financiamentos imobiliários. Trata-se em tese de bom dinheiro: em 2015, venderam-se R$ 8,5 bilhões em CRIs.

O dinheiro para financiar o início da produção agrícola já fora anunciado. No final de 2015, fez-se uma gambiarra esperta para que o Banco do Brasil ofereça R$ 10 bilhões para o chamado "pré-custeio", dinheiro que não emprestava porque o governo não tinha dinheiro para bancar o subsídio, compensar o banco (a taxa de juros é negativa, abaixo da inflação). Agora, haverá subsídio indireto.

Outros R$ 5 bilhões iriam para o capital de giro de pequenas empresas (financiar estoques, clientes, pagamentos a fornecedores), graças a um programa de garantia chamado BNDES FGI. Empresas menores têm dificuldade de arrumar garantias exigidas por bancos. Assim, não conseguem crédito ou pagam caro. Pelo FGI, o BNDES oferece a garantia que o empresário mais modesto não tem. Esse mecanismo pode ser um alívio para os asfixiados por crédito caro e fornecedores inclementes, um calmante de quebradeiras.

Enfim, há R$ 22 bilhões para infraestrutura, na prática outra "linha de crédito" com dinheiro do FGTS. A ideia é facilitar o processo de concessão de empréstimos. O dinheiro já está lá. Basta saber se e quanto investimento em infraestrutura haverá para fazer. A coisa anda mal parada desde 2013, pelo menos.

No varejo, não é mau. Pode evitar que mais gente se afogue na lama da crise. O problema é que, no atacado, o governo não apareceu com planos para tirar o país do atoleiro.